O papel dos pais, limites e falta de regras
Pais, mães e cuidadores, dentre outros membros significativos da família, durante todo o período da infância, esforçam-se para preparar seus filhos para tornarem- se adultos, ou seja, buscam auxiliá-los a desenvolver estratégias cognitivas e emocionais que os possibilitem enfrentar de forma bem sucedida os desafios que estarão por vir. Na infância, a relação entre pais e filhos se caracteriza pela completa dependência física e emocional.
Ao transcorrer do tempo, as crianças desenvolvem novas habilidades e formas de pensar que vão capacitando-as para enfrentar, com sucesso, novas demandas. Elas passam a conseguir realizar atividades de autocuidado (higiene, alimentação, etc.) sem a interferência dos pais, desenvolvem formas de pensamento menos concreto que as permitem visualizar situações fora de sua experiência imediata e sob diferentes perspectivas, tornam-se mais habilidosas fisicamente e mais preparadas emocionalmente para tolerar frustrações.
Essas transformações são possíveis, porque os pais percebem as novas capacidades de seus filhos, a crescente autonomia dos adolescentes e o abandono de antigas funções parentais não significa que os pais percam sua importância na vida de seus filhos. Pelo contrário, os pais adaptam seu papel às necessidades de desenvolvimento dos jovens, deixando a função de provedor e administrador supremo, engajando-se em uma nova função, que consiste em fornecer apoio, mais do que de comando.
O momento de maior tensão entre pais e filhos parece ocorrer na ocasião em que estes estão atravessando as mudanças da puberdade. Fierro (1995) destaca que, nesse momento, os filhos tendem a se tornar mais distantes de seus familiares – característica essencial para o ingresso na vida adulta – e a comunicação dentro da família pode tornar-se mais difícil, devido a divergência nas opiniões e na forma de perceber e lidar com as situações. O autor assinala, entretanto, que, com o decorrer do tempo, o distanciamento tende a diminuir e a comunicação tende a ficar mais fluida, embora possa persistir a falta de intimidade com os pais no que diz respeito a relacionamentos amorosos e sexuais ou relações de amizade dos adolescentes. Da mesma forma, Cole e Cole (2003) destacam que a intensidade dos conflitos entre pais e filhos inicia-se com as transformações da puberdade e tem seu auge até a metade da adolescência, tendendo a declinar à medida que os anos passam.
Esses autores destacam que esse processo de autonomia em relação à família não ocorre da mesma maneira para todos os adolescentes. Os motivos para essa divergência são muitos, a começar pelas práticas parentais utilizadas pela família, sendo que alguns pais favorecem a autonomia de seus filhos, enquanto outros agem de forma a estimular sua dependência. As práticas que os pais utilizam para educar seus filhos podem incluir diferentes características. O conjunto de práticas utilizadas pelos pais é denominado como práticas educativas parentais e se agrupam, de forma geral, em quatro estilos: democrático, autoritário, permissivo ou negligente.
Stengel (2011) ressalta que a família atual sofreu intensas modificações no decorrer das últimas décadas, deixando um modelo no qual prevalecia a autoridade paterna e a falta de diálogo aberto entre os membros da família, para um modelo mais igualitário, com maior respeito entre os membros. Nessa nova configuração familiar, na qual as funções têm sido revistas, estão surgindo desafios à delimitação de papéis, exigindo que estas relações sejam reinventadas, principalmente, porque muitos pais foram criados em famílias tradicionais e hoje educam seus filhos sem ter tido modelos para tornarem-se pais mais democráticos.
Há uma discussão a respeito dos pais serem amigos de seus filhos. Muitos pais, por terem tido uma educação, na qual prevaleciam as práticas educativas autoritárias e persistia a falta de diálogo, de interações afetivas, procuram estabelecer com seus filhos uma relação de total igualdade, em que os filhos ditam as regras para suas próprias vidas. Alguns pais se isentam, desde a infância de seus filhos, de estabelecerem as regras básicas para uma educação adequada, como a delimitação de uma rotina que inclua horários para a realização de refeições, sono e atividades escolares, por exemplo. Sabe-se que as crianças não têm capacidades emocionais e cognitivas desenvolvidas a ponto de poderem fazer escolhas importantes ou mesmo discernir quais são as condutas apropriadas ou inapropriadas para sua vida. Na verdade, a função fundamental dos pais é ensinar a seus filhos todas as habilidades necessárias que vão desde higiene, alimentação, cuidados com objetos pessoais, habilidades interpessoais e valores morais. Dessa forma, pais que ao colocar-se no papel de amigos de seus filhos abandonam sua função primordial de educadores, e acabam por negligenciar as necessidades mais básicas dos filhos, prejudicando o seu desenvolvimento.
Bibliografia:
COLE, M.; COLE, S. O desenvolvimento da criança e do adolescente. 4a edição. Porto Alegre, Artmed, 2003.
FIERRO, A. Desenvolvimento da personalidade na adolescência. In: COLL, C.; PALÁCIUS, J e MARCHESI, A. (Org.). Desenvolvimento psicológico e educação: psicologia evolutiva. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.
STENGEL, M. Discursos de pais e mães sobre a amizade em famílias com filhos adolescentes. Paidéia (Ribeirão Preto), Ago 2011, vol.21, no. 49, p.217-225.
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